20 de fevereiro de 2011

Apropriação do jardim do Museu da Cidade - 3/4

Os 5 “arquivos” possuem de um lado uma representação de uma parte do museu e no verso um texto de Arthur Schopenhauer («O mundo como vontade e representação, III, 39»  in «O sublime») escrito em tiras de cartolina laranja e duas faixas de velcro – transpondo uma ideia de perigo.
Assim sendo, a peça escultória que apresenta diferentes ambientes do jardim pela ordem de aparecimento numa incursão através da porta principal do museu (os pavões; a estátua do Eça de Queirós; o centro de exposições temporárias, que nesta altura apresentava uma exposição de fotografia sobre África; a fonte; e o Jardim Bordalo Pinheiro). Podemos dizer que a peça possui como “esqueleto” a parte do “arquivo” onde está escrito à mão o texto de Schopenhauer (ver em baixo). Esta referência aponta para o cerne selvático da natureza, mesmo quando artificialmente organizada sobre a forma de jardim.

«A natureza em tempestuosa agitação; incerta luz entre nuvens de furacão, negras e ameaçadoras; rochas desleais, nuas e perigosas que tapam a vista com o seu volume; águas cachoantes e espumantes por todo o deserto e gemidos do vento que sopra nas gargantas. A nossa insuficiência, a nossa luta, com a natureza inimiga, a nossa vontade despedaçada manifestam-se a nós intuitivamente. Mas, enquanto a angústia pessoal não predominar, enquanto persistimos na contemplação estética, é o puro sujeito do conhecimento que olha através daquela luta da natureza (…) e [que], tranquilo, imperturbado e não envolvido nos objectos que são realmente ameaçadores medonhos para a vontade, capta as ideias. É precisamente neste contraste que está o sentimento do sublime. Mas mais poderosa ainda é a impressão, quando a batalha dos elementos desencadeados assume grandes proporções diante de um vasto mar em borrasca; ondas da altura de prédios sobem e descem, batem impetuosas contra a penedia, lançam ao céu as suas espumas; a tempestade brame, o mar ruge, raios coriscam das nuvens negras e o ribombar do trovão vence o bramido da tempestade e do mar. Perante esta cena, o espectador imperturbado adquire o conhecimento máximo do carácter duplo da sua consciência: sente-se como indivíduo, como lábil manifestação da vontade (…) e, simultaneamente, percebe-se como sujeito imortal, sereno do conhecer.»






Por Sérgio Coutinho

16 de fevereiro de 2011

‘Parque Urbano no campo Grande’ ou ‘Oportunidades’ - Por Miguel Rocha

  Tive há pouco tempo a oportunidade de rever um livro sobre a Lisboa de Ressano Garcia (entre 1874 e 1911) no qual um dos planos coordenados por este urbanista (Plano Geral de melhoramentos da capital, 1903-1904) propõe um grande Parque Urbano, na zona do Campo Grande. A implantação da República e a morte de Ressano Garcia (em 1911) são as prováveis causas para este Plano (uma espécie de ‘upgrade’ do Plano das Avenidas Novas, de 1888) nunca ter sido executado. Só a partir dos anos 30, por impulso do engenheiro Duarte Pacheco, algumas das ideias desse plano começaram a ser adotadas, adaptadas e postas em prática. A área prevista para implantar o Parque Urbano foi ocupada pela cidade universitária com o seu estádio e o hipódromo do campo Grande.
  Com este desfecho perdeu-se a oportunidade de termos um grande Parque Urbano (nas figuras dá para entender a dimensão do parque proposto por comparação com o Parque Eduardo VII) numa zona que tendo sido de expansão durante o século XIX e início do século XX, é hoje uma das mais centrais de Lisboa.

  Como este projeto existem inúmeros casos em Lisboa de grandes planos e projetos que por motivos diversos não saem do papel ou são parcialmente executados ou acabam por ser versões adaptadas e coxas de ideias de grande impacto. Temos casos destes que já veem de há séculos atrás, como o Palácio Nacional da Ajuda, ou outros casos mais recentes como o Plano da Costa do Sol, os diversos planos para a Costa de Caparica ou o novo aeroporto. Nos últimos 30 anos esta lista aumenta e qualquer projeto que implique uma solução menos ortodoxa, de grande impacto provoca logo apaixonada discussão e movimentos contra a sua construção. Polémicas como a das Amoreiras, Centro Cultural de Belém, terminal de contentores, túnel do Marquês e as suscitadas sempre que se propõe um arranha-céus mostram uma resistência (será mesmo medo?) visceral à mudança que na verdade traduz uma cultura de participação pobre.
  Limitar o nosso papel na construção coletiva da nossa cidade a dizer não a qualquer iniciativa arrojada e com capacidade de a transformar é um exercício democrático pobre, infantil e principalmente perigoso. Se continuarmos a seguir este caminho fácil não tardará o dia em que alguém diga que se o poder democrático só serve para impedir que se faça em vez de servir para fazer, então não serve para nada. A nossa democracia atingiu uma maturidade que não pode permitir que estes grandes planos e projetos continuem a ser exclusivamente fruto da iniciativa e teimosia de personagens, como o Marquês de Pombal, Ressano Garcia, Duarte Pacheco, com uma aura autocrática e normalmente apoiados por regimes não democráticos.  
  Não estou a dizer que sou a favor dos projetos que enunciei e que temos de fazer todos os projetos mais ou menos megalómanos que aparecem por ai. Sinceramente, não tenho opinião formada acerca de muitos deles, uma vez que também os media não contribuem para uma discussão muito séria deste tipo de casos, preferindo alimentar polémicas e as pequenas tensões políticas que elas envolvem a informar o grande público sobre o objeto de discussão propriamente dito.
  A grande vantagem que temos, nos dias que correm, é que cada vez dependemos menos dos media. Qualquer um de nós pode informar-se, consultar 3, 4, 1000 fontes diferentes, de diferentes espectros, tirar as nossas próprias conclusões e ter a nossa posição sobre determinado assunto. Só assim podemos participar de uma forma honesta e inteligente na construção de uma cidade e sociedade mais competitiva e desenvolvida.
  Quando voltamos de Nova Iorque ou Madrid, fascinados com o Central Park ou com o Parque do Retiro devemos lembrar-nos de que também nós tivemos oportunidade de ter algo semelhante em Lisboa, e que está na nossa mão aproveitar oportunidades como a que perdemos no caso do Parque Urbano do Campo Grande.
Bibliografia: ‘Lisboa de Frederico Ressano Garcia 1874-1909’, direção de Raquel Henriques da Silva, editado pela Fundação Calouste Gulbenkian com apoio da Câmara Municipal de Lisboa, maio/abril de 1989.

14 de fevereiro de 2011

Museu da cidade tropical.

Apropriação do jardim do Museu da Cidade - 2/4

O que pretendi criar – uma obra maleável, escultórica, através da divisão pessoal do Jardim em 5 partes diferentes:
-Os pavões;
-A escultura do Eça de Queirós;
- O centro de exposições temporárias, que nesta altura apresentava uma exposição de fotografia sobre África;
-A fonte;
- O Jardim Bordalo Pinheiro.

Três pequenas caixas guardam elementos resgatados do jardim:
-Pedras;
-Folhas;
-Porcelana das esculturas do Jardim Bordalo Pinheiro.





Por Sérgio

11 de fevereiro de 2011

Sobre imagens e arquitectura.

           Em Lisbon Story, há um realizador que filma com a câmara de filmar atrás das costas. O filme, esse, é depois escondido para que ninguém o possa ver. A busca é a da não significação da imagem, anulando a produção e a recepção da mesma.

          Em Blow Up, as imagens possuem, aos olhos do produtor e receptor das mesmas – do fotógrafo – informações concretas que apenas nelas se conseguem vislumbrar. A realidade fotográfica é, em si, estimulante de uma nova versão da realidade fotografada.

          A pretensão documentarista do primeiro caso, revestida por uma resolução curiosa (e pragmática até), é contraposta pela construção do segundo, que se revela, em si, total. Ambas existem apenas no espaço fotográfico do filme, assim como tudo o que nele figura.

           E a arquitectura, a coisa concreta? Para essa deixemos a câmara atrás das costas. É que a conversa é outra. 





Por Pedro Lucas

9 de fevereiro de 2011

"Do bloco de notas de Rudy O’Mark no dia 22 de Janeiro de dois mil e onze" - Martinho

            As lógicas não são prioritátias nem fiáveis: é uma ideia que partilhamos há já alguns anos, eu e os meus amigos, ou melhor, os meus amigos e eu.
É assim que se deve dizer.
Não são regras ou paradigmas, são apenas coisas, momentos, cenas, ou até pormenores, até isso aceito, questões de hábito, cumplicidades próprias que não se podem abrir assim, sem mais nem menos.
            Há dois dias que não como e a televisão só passa merda. A senhora Green acha que estou a passar por uma fase. Perguntei-lhe: Que fase? Disse-me que era o crescimento. Nada mais.
            O crescimento é uma fase?                               
            Ontem à noite a merda era sobre um casal quarentão que descobria que a felicidade dos seus amigos era toda ela uma mentira, e que em vez de serem olhados como mais um casal, simples, pequeno, eram o símbolo ou exemplo duma impossibilidade cósmica: a felicidade. Isso provocava inveja, mal-estar, olhares hipócritas na comunidade. Como disse, era uma merda, mas era uma merda bem feita, porque mexeu-me todo por dentro. Num certo momento o homem teve de perguntar à mulher se ela achava que eles eram normais. Ela não respondeu, mas depois sorriu, e depois respondeu-lhe com a sua mão na dele, e ele acalmou-se, e parou de chorar — esqueci-me de dizer: ele estava a chorar baba e ranho, um homem gordo e careca a chorar baba e ranho. Tocou-me.
            Acho que a felicidade existe. Há coisas que são muito bonitas. Reconhecê-las não é uma questão de disposição. Não sei o quê. Acho parvo que não se queira ser feliz à séria. Também acho parvo querer ser feliz por tudo e por nada. Deve haver um meio termo. De certeza que há um meio termo: é para isso que os meios termos foram feitos, para pessoas que existem mesmo.
            Conheci algumas pessoas assim. Algumas eram simpáticas.
            Não acho que o crescimento seja uma fase, mas sim um momento eterno. A idade é uma fase. Isso sim. Parece-me bem. Cada idade é uma fase. Algumas idades são mais fases do que outras — ou se calhar algumas idades são menos fases do que outras. Não sei. Talvez. Ontem tinha vinte e quatro anos e hoje continuo a ter vinte quatro anos mas sinto-me ligeiramente diferente. Sei lá, é do ar.
            Dizia que havia coisas bonitas no mundo.
            É verdade.
            Uma coisa bonita, para mim pelo menos, é ouvir discos, canções. Chegar a casa, ligar o computador, ligar as colunas e ir à internet. Não tenho música no computador, só na cabeça. Só preciso que uma canção comece e tenho a noite feita.
Ainda assim não como há dois dias.
Acho que preciso de ver filmes. O problema é esse: não tenho visto filmes. Tenho de tratar disso.
            O Mark veio visitar-me hoje de manhã. Disse que se ia casar. Ela é espanhola e estão juntos há cinco anos. O Mark disse que não podia adiar mais. Perguntei-lhe: Então não é uma questão de sim, é uma questão de tempo. Ele riu-se e disse que eu era estranho. Pus uma música a tocar e depois disse-lhe: Gosto deste tipo, canta bem. O Mark não disse nada. Perguntei-lhe: Não achas? Ele continuou sem dizer nada. Quer que eu seja o padrinho dele. O casamento será em Alicante, que pelo que ele me diz é no sul de Espanha. Ele nunca lá esteve. Eu também não. Nunca passei de França para baixo. Gosto demasiado disto para ir de França para baixo.
            Como é que serão as pessoas do sul de Espanha quando estão no Sul de Espanha?
            Tive um amiga espanhola. Viva comigo e com outro espanhol em Helsínquia.
            Acho que ainda me lembro deles.
            Em Agosto vou ter de ir a Alicante, sul de Espanha, para ser padrinho de casamento de Mark Loy, escocês, vinte e sete anos, licenciado em engenharia física, mestrado em fibras energéticas, empregado na Telefónica Britânica, namorado de Maria Canterúbia, espanhola, vinte e seis anos, licenciada em engenharia física, mestrado em fibras energéticas, empregada na Espanha e ligações.
            Parece-me um bom plano. Estará calor em Agosto no sul de Espanha?
            Ela chamava-se Preciosa. Acho que era isso. Ele tinha um nome maior, Juan Carlos ou assim. Bebiam pouco porque não tinham dinheiro. Eu também não tinha mas bebia muito, embora não fosse tanto como os finlandeses. Não comprei discos nem vi filmes nesse tempo.
            Era uma fase.
            Uma fase da idade.
            Para além disto não sei muita coisa sobre Espanha.
            Tenho de comprar um guia. Inscrever-me em aulas de espanhol. Conseguir dizer algumas frases, sérias e profundas, mas nada de complexo. Não tenho tempo para isso. Podia praticar com a senhora Green. A senhora Green contou-me uma vez que o seu terceiro marido era Venezuelano. Tinham uma casa bonita em Caracas, com varanda e tudo, e que o Verão deles era no nosso Inverno e que durante o casamento foram ambos felizes e quentes.
            Acho que a senhora Green me mente para ser feliz, mas não me importo e sorrio, passando com o saco das compras.
            Apetece-me comer.
            Não como há dois dias e não percebi ainda bem porquê.
            Às vezes acontece-me uma coisa estranha: quando leio livros ou vejo filmes ou vejo quadros (com a música, curiosamente, isso não me acontece), devido a algum espasmo criativo ou assim — expressão caricata número cento e trinta e dois: “espasmo criativo” — achar que estou doente. Há uma doença que é assim, com nome e tudo, um síndrome qualquer. É estranho: pessoas doentes por acharem que estão doentes. Uma lógica marada. Nada que não se saiba. Essas pessoas são loucas. Fazem-me vontade de rir. Eu não sou louco, só não tenho tido fome.
            Os dias vão passando bem. Se calhar consegue-se viver sem fome.
            Se calhar não. Apetece-me comer.
            Será só apetite, fome ou gula?
            O Mark trouxe-me um livro. Acho que era uma maneira de me obrigar a dar-lhe uma prenda, como padrinho de casamento que sou. O Mark conhece-me bem, demasiado bem para me dar um livro sem mais nem menos. Sabemos ambos o que isso significa. É um bom amigo, o Mark. Tem pinta, estilo, gota. O que é que isso quer dizer, gota? Não sei. Mas é uma coisa boa, um elogio, uma característica interessante.
            As pessoas esquecem-se de que nos conhecemos uns aos outros melhor do que elas nos conhecem.
            Gosto de música celta. Anima-me, relaxa-me. Piadas, humores.
            Tenho fome.
            A Maria gosta de barcos. Vou oferecer-lhes um barco em miniatura e escrever o nome deles na proa. É uma coisa bonita. Um barco branco com uma risca azul e o nome dos dois na proa. Assim não o largam. Nunca mais.
            Gosto desta banda. Estou feliz.
            Tenho fome. Acho que vou ao supermercado comprar qualquer coisa.
            Amanhã vai acontecer não sei o quê mas vai. Podemos confiar nisso.

2 de fevereiro de 2011

1º Poema sobre o Recreio Inédito

Valoroso, Valente, Viril, Verme: Eu
Irascível e um nós feito de dicionários (sem “D”: de domínio)
Portanto, somos feitos de “icionários”, somos “icionantes”,
E não Fic-cionantes.
Atenção!
Creio que reunidos pelas primeira vez, então
Unidos pelo frágil tacto e gritaria furibunda.

Bola-apanhada-crocodilo-cabracega-zás-pumbas

Re-creio: Unidos ineditamente por isto.
Mente e corpo, e mente e mentira,
E cada vez mais tudo,
E cada vez mais nada.

Bola-apanhada-crocodilo-cabracega-zás-pumbas

Eu queria tanto crer numa sedução brutal,
Mas a nossa é a que pode vir.
Veio no jeito de quem vem, unido, sombra, festa.
Veio, veio, veio, veio, e presta.
Presta?
Re-creio.
Ao ser como é – “icionante” – esta força bruta:
Sedução; nunca possibilitaria um simples recreio,
Nem mesmo um recriar.
Apenas creio. E na
“Bola-apanhada-crocodilo-cabracega-zás-pumbas”
Escondo uma lágrima de joelho esfolado.
(Ou será de sorriso rasgado?)

Bola-apanhada-crocodilo-cabracega-zás-pumbas

Por Sérgio

1 de fevereiro de 2011

Bicho Cobra Cobre


Por Perrine

Capa nº5


Por Perrine

Calendário de Fevereiro

Dia 1 (Terça)
– Declaração
– Calendário
– Capa por Perrine

– Bicho por Perrine
Todas as Terças-feiras do mês

Dia 2 (Quarta) – 1º Poema sobre o Recreio Inédito por Sérgio Coutinho

Dia 3 (Quinta) – “Um real que já não pode ser tocado”:
1-Por Mariana Gama
2-Por André Nave
3-Por Perrine
4-Por Joana Duarte
Todas as Quintas-feiras do mês

Dia 6 (Domingo) – Apropriação do jardim do Museu da Cidade por Sérgio
Todos os Domingos do mês

Dia 7 (Segunda) – O meu pequeno barco por Eusébio Carvalho

Dia 9 (Quarta) – Crónica por Martinho Lucas Pires 

Dia 11 (Sexta) – Opinião por Pedro Lucas

Dia 14 (Segunda) – Vídeo por Mané e Bora: Tropicália

Dia 16 (Quarta) – Opinião por Rocha

Dia 18 (Sexta) – Programa "Tripé-coxo" (prometido) -- reconsiderou-se o seu lançamento para Março pela certeza de podermos lançar um programa novo todas as sextas do mês, o que seria mais estimulante.

Dia 21 (Segunda) – Curta por Martinho

Dia 23 (Quarta)
– Opinião por André Nave
– Vídeo por Lucas (prometido)

Dia 25 (Sexta) – Entrevista à malta do “Tripé-coxo” -- reconsiderou-se o seu lançamento para Março pela certeza de podermos lançar um programa novo todas as sextas do mês, o que seria mais estimulante.

Dia 28 (Segunda)
– 1º Show do Mané e do Cristovão

Declaração de Fevereiro: TRriiiiiiiiimm

De regresso.

E para partir tudo!

Novas participações, novas brincadeiras. Não vamos destacar nada, porque toque para o recreio é já por si destaque. A verdade é que não podemos estar muito tempo ausentes senão esquecemo-nos de como se brinca.

Pumbas.